segunda-feira, maio 28, 2012

Presente ao Passado


A sensibilidade é uma característica essencial presente nos filmes. A despeito da crescente digitalização, a exposição dos filmes fotográficos ou cinematográficos à maior ou menor luz é caracterizada pela sensibilidade da película. Assim como o tema da sensibilidade da película neste mundo digitalizado, o passado está sempre pedindo para ser lembrado no presente. Esta pode ser matéria da memória ou da história, até do inconsciente, mas é importante revisitar os fatos da história, principalmente os traumáticos.

O cineasta alemão Robert Thalheim resolveu usar a sensibilidade fílmica e de realizador para colocar nas telas uma das possíveis abordagens sobre o massacre de 1,5 milhão de judeus nos três campos de concentração de Auschwitz, no sul da Polônia. Em À Espera de Turistas (Am Ende Kommen Touristen) A abordagem do diretor é do ponto de vista do presente. Um jovem alemão, Sven (Alexander Fehling, de Bastardos Inglórios) resolve prestar serviço comunitário no Albergue da Juventude local em vez do serviço militar. Ele vai cumprir todo o tipo de serviço, ajudar nas atividades pedagógicas, ser guia, mas uma das suas funções será cuidar, atender, ser o motorista de um dos sobreviventes do massacre, o Stanislaw Krzeminski (Ryszard Ronczewski).

Nesta relação entre Sven e Krzeminski está o segredo do argumento de Thalheim. No início, Sven conduz o judeu polonês para testemunhos sobre o campo de concentração e não se envolve com nada. Ele ainda não entende o que se passa neste local onde tantas coisas terríveis aconteceram. É apenas um jovem prestando serviço comunitário. Com o passar do tempo, as impertinências de Krzeminski passam a incomodá-lo. No carro, o dobrar à esquerda ou direita, o acendedor de cigarros ou a fita cassete com músicas de Schubert, alemão e não polonês como Chopin, são as exigências do velho sobrevivente.

Mas Sven passa a se envolver, tanto com Krzeminski quanto com Ania (Barbara Wysocka) , uma jovem guia local que lhe aluga um quarto. Ela nunca saiu de lá, mas tem a chance de uma bolsa de estudos na Bélgica. Em alguns pontos, o confronto entre o presente e do passado é maior. O primeiro grande embate quando a empresa química alemã, maior empregadora local, chama o judeu para dar o seu testemunho a estagiários. A diretora da empresa não assiste ao depoimento e diz ao polonês que todos são muito gratos pela presença. Mais tarde, ela explica a Sven, que é difícil para a geração dela se confrontar com o passado, após interromper um discurso de Herr Krzeminski.

O ancião não quer sair de lá, mesmo que a família tente o convencer a deixar o traumático local. Ele tem uma fixação em consertar malas. As malas são um dos principais símbolos dos judeus mortos no local, são os objetos que mais impressionam os estudantes que visitam o Museu do Holocausto. Neste confronto do presente e do passado, com a sensibilidade de não julgar, de não vilanizar e de tentar resolver um pouco a traumática equação que ainda atormenta alemães, poloneses e o resto do mundo, mais de 60 anos depois, é que esta produção de 2007 que tem estreia nos cinemas gaúchos nesta semana (no Instituto NT) tem todos os méritos possíveis, talvez  
por isso tenha sido selecionada para a mostra Un Certain Regard, do Festival de Cannes e o ator Alexander Fehling tenha ganho o prêmio de Melhor Ator no Festival de Munique. Sendo assim, considerem o filme uma espécie de presente do tempo presente ao passado.


 “À ESPERA DE TURISTAS”

Am Ende Kommen Touristen, Alemanha, 2007, 85 minutos

DIREÇÃO: Robert Thalheim

GÊNERO: Drama

ELENCO: Alexander Fehling, Ryszard Ronczewski, Barbara Wysocka, Piotr Rogucki, Rainer Sellien, Lena Stolze, Lutz Blochberger, Willy Rachow