segunda-feira, agosto 13, 2012

Intocável que nos toca




Nos milhares de filmes aos quais já assisti, sempre pode haver aqueles casos raros, não incomuns, de obras que tangenciem de alguma forma a realidade, mas que sejam construídas de um jeito que nos faça rir e chorar ao mesmo tempo, acreditar na vida e ter a consciência das nossas limitações e da finitude neste intervalo entre nascer e morrer que é a vida. Deixando os preâmbulos realistas ou niilistas, queria começar dizendo que Intocáveis, filme dirigido por Eric Toledano e Olivier Nakache, que recebeu nove prêmios César, é outro destes filmes que nos arrebatam do começo ao fim. Os irmãos Weinstein, produtores garimpeiros de jóias raras tanto do cinema americano quanto do europeu ou asiático, chegam a apresentar cinco razões para se ver o filme, endereçado principalmente aos norte-americanos. Vale lembrar que esta tragicomédia está sendo até agora a maior bilheteria de um filme estrangeiro em 2012 nos Estados Unidos.

Desde que temos a sequencia inicial do filme, já é possível acompanhar o pensamento dos Weinstein o filme leva às lágrimas de alegria. O jovem negro, de origem senegalesa, morador dos arredores de Paris, Driss (Omar Sy), se inscreve para cuidar de um aristocrata francês tetraplégico, Philippe (François Cluzet), mas o seu único objetivo é conseguir uma nova assinatura de recusa para acionar novamente o seguro desemprego. A franqueza, o humor, o jeito truculento e principalmente a não necessidade de compaixão, de pena que Driss demonstram acabam cativando Philippe, que o contrata. Vale lembrar que o filme é baseado na história real contada pelo milionário Philippe Pozzo di Borgo, “O Segundo Suspiro. Os dois ainda vivem e tem uma forte relação de amizade.

A intensidade desta relação, os choques culturais evidentes e a gratidão que um irá sentir pelo outro por esta convivência passam a cativar o espectador. O bom humor de Driss contagia gradativamente as pessoas que cuidam de Philippe na mansão da família em Paris. Enquanto tenta entender um universo permeado por quadros de Salvador Dalí e Goya, por músicas de Vivaldi, Berlioz e Bach, Driss acaba cuidando de Philippe nos cuidados com o seu corpo, mas principalmente no destravar emocional. Enquanto tenta resolver pequenos conflitos na sua família no subúrbio, Driss também tenta mostrar ao novo amigo rico que as piadas sobre deficientes podem aliviar o ambiente, que o humor pode ser redentor e que um amor verdadeiro, palpável, pode ser tão bom quanto aquele rebuscado e epistolar com uma desconhecida.

A descoberta de como é viver sem movimentos do pescoço para baixo também causam um choque em Driss, que inicialmente se nega a limpar o novo patrão e amigo, mas que acaba sendo mais que um acompanhante e sim alguém que pode mostrar um mundo cheio de verdades, de movimento, de intensidade, proporcionar voos a Philippe, que perdeu os movimentos justamente por causa de um voo de parapente. Mesmo rindo de obras de arte contemporânea e ridicularizando o preço excessivo de alguns respingos numa tela ou criticando as quatro horas de uma ópera, após rir no início de uma ária, Driss é perspicaz e quer aprender a pintar, quer dar os seus respingos na vida e na arte.

Um filme realmente tocante, que nos dá uma alegria imensa, com a paradoxalidade de uma relação de duas pessoas tão distantes, mas que também nos faz chorar bastante pelos pequenos e grandes dramas do jovem pobre e do tetraplégico rico, aprender que enquanto houver vida, há esperança. Este filme é esperançoso, é intocável no seu toque sutil no subjetivo de cada um. Um dos melhores filmes franceses dos últimos cinco anos. Corram aos cinemas quando estrear. Não percam.



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